Ensaio não é só para artista

Na correria do dia a dia, cada vez mais executivos se deparam com a falta de tempo para se prepararem corretamente antes de  suas apresentações. Muitas vezes, acabam recebendo os briefings minutos antes de subirem no palco.  É fato que falar  bem depende muito mais de treino do que carisma. Da mesma forma, o sucesso de grandes apresentações que surpreendem a  plateia está intimamente ligado ao conhecimento que o executivo tem do tema e da empatia que ele estabelece com o público.

Steve Jobs é um bom exemplo de sucesso em apresentações. Superou o medo de falar em publico depois de identificar seus pontos fracos. Recorreu a especialistas de comunicação, como Regis McKenna, para ajudá-lo e passou horas e horas treinando suas palestras antes de cada anúncio de um novo produto ou antes de discursos memoráveis como o feito na Universidade de Stanford. Tanto treino fez com que ele se distanciasse dos chatos do mundo de tecnologia e fosse colocado em outro patamar, o de gênio. Até a concorrência concorda, tenta copiar, mas não consegue porque falta emoção, sinceridade, cumplicidade com os ouvintes e, sobretudo, treino, muito treino…

Outro bom exemplo de dedicação que gera resultado é dado pelos políticos. Eles treinam e treinam por horas e horas e (em, alguns casos, por dias) suas apresentações e participações  em debates.  Temos discursos sensacionais que valem a pena sempre serem revistos. Temos também casos de pessoas que acabam acertando porque reconhecem que precisam fazer ajustes. Quem não se lembra das últimas eleições presidenciais, em 2010, quando a candidata Marina Silva apareceu com um novo casaco após o intervalo em um dos últimos debates. Fez bem, pois definitivamente não vale insistir numa roupa que não agradava os telespectadores.

Mas por que os empresários não se inspiram nesses modelos e fazem diferente nas suas palestras e na condução da estratégia de comunicação das empresas que eles comandam? Difícil responder de forma única. Acredito que a comunicação, infelizmente, seja tratada só no final, na véspera do anúncio de um novo produto ao mercado, porque muitos dos executivos se consideram experts em tudo que fazem. Mas, na hora H, eles sobem no palco, gaguejam,  não respondem as perguntas da plateia e saem como se nada daquilo tivesse acontecido.

Atores de TV e de cinema refazem uma cena dezenas de vezes; apresentadores de telejornal treinam diariamente suas vozes com a ajuda de fonoaudiólogos; atletas se dedicam sem parar para melhorar seus tempos em algumas frações de segundo. Então, por que os executivos — incluindo não só presidentes, mas diretores e gerentes–  não preocupam antes de apresentações internas e externas?  Por que as empresas não oferecem esse tipo de suporte a eles? Posso dizer que essa é, sim, uma importante questão  para reflexão.

As palestras que assisti de executivos que deixaram a plateia — e eu — de boca aberta são inesquecíveis.  Em comum, muito mais do que apresentações  coloridas, elas se destacaram porque tinham sempre boas histórias e foram contadas com tanto entusiasmo que fizeram com que os ouvintes não se dispersassem. Os palestrantes pareciam, também, treinados e confortáveis no palco, foram objetivos, priorizaram o conteúdo antes de efeitos técnicos, fugiram do lugar-comum e envolveram o público com os temas de suas apresentações.  No final, além de ovacionados, ganharam o coração dos admiradores.

Dizem que sucesso é uma mistura de competência com sorte. Eu penso um pouco diferente. Para mim, sucesso é uma mistura de competência com treino. Andar e correr todos conseguem, mas para conseguir fazer uma prova não basta só colocar o tênis no pé e sair. É preciso estar descansado, alimentado corretamente e bem condicionado. A plateia agradece se os executivos brasileiros começarem a fazer a lição de casa também na área de comunicação. A vida nos mostra que ensaio não é só para artista.

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